Não raro muitas
empresas integralizam o seu capital social com bens imóveis para iniciar o
exercício de suas atividades. Comumente, tal se verifica nas holdings, empresas constituídas para o
fim de administrar bens próprios, as quais poderão adotar qualquer modalidade
de sociedade empresária, sendo, em regra, uma empresa limitada ou sociedade
anônima.
Após a regular
constituição da empresa[1], com o laudo de avaliação
do bem imóvel[2]
para a integralização do capital social, faz-se necessário, nos termos do
princípio da continuidade registral[3], o registro deste contrato
social no Registro de Imóveis para o fim de transmitir os bens imóveis da
pessoa do sócio para a pessoa jurídica na qual aquele faz parte.
Neste esteio, vale
lembrar que o contrato social devidamente registrado no Registro Público
competente[4] basta por si só para ser
levado ao registro para a transmissão da propriedade[5] em conjunto com as cópias
autenticadas dos documentos pessoais dos sócios, laudo de avaliação dos bens
registrado com o contrato social, certidão de valor venal e a certidão de
imunidade do ITBI expedida pelo Município competente[6], situação essa que não se
verifica quando a pessoa jurídica, por intermédio de seus sócios, delibera, nos
termos da sua modalidade de sociedade empresária, pela transmissão dos bens
imóveis aos seus sócios, mesmo como dação em pagamento de quotas, motivo pelo
qual faz-se necessária a escritura pública[7] ou, quando o caso, a
sentença judicial com a apuração de haveres de liquidação da sociedade e
eventual constatação no inventário para a partilha[8].
Pois bem, levado o
contrato social ao Registro de Imóveis importante constatar que: (1) não se faz
necessário informar o locatário da integralização, pois não há direito de
preferência[9];
(2) deve constar os elementos individualizadores dos bens, de seus
proprietários e as necessárias outorgas uxória e marital[10], (3) possibilidade,
no próprio instrumento do contrato social, com a certidão da Junta Comercial,
fazer constar (para fins de registro no Registro de Imóveis), a instituição de
reservas de usufruto, por retenção e não por alienação, aos próprios
transmitentes das nuas-propriedades dos imóveis destinados à integralização do
capital social, o que dispensaria a escritura pública[11]; (4) apresentação do
documento no original[12], (5) verificação de
cláusula no contrato ou estatuto social na qual prevê, se o caso, como se
operacionalizará a aprovação do laudo de avaliação[13]; (6) conferência de bens
para integralização do capital social da empresa deve observar o princípio da
especialidade objetiva e não uma transcrição antiga, lacunosa, inexata e
imprecisa[14],
(7) observância da legislação a época da prenotação e não a época da
constituição da sociedade empresária[15], (8) caso a esposa ou o
marido não participe da sociedade, faz-se necessário a escritura pública da
pessoa que não será sócia para a integralização, não bastando a mera anuência[16], (9) em que pese a nossa
discordância, necessidade de apresentação de CND do INSS e da Receita Federal
da sociedade transmitente (artigo 47, “b”, I, da Lei nº 8.212/91)[17].
Outrossim, em que
pese o foco deste estudo ser o Registro de Imóveis, não se pode deixar de
considerar que o Superior Tribunal de Justiça tem entendido pela incidência de
Imposto de Renda sobre ganhos de capital decorrentes da diferença entre o valor
de aquisição do bem imóvel e o de integralização para o capital social de pessoa
jurídica[18].
Em contrapartida, já houve a manifestação do mesmo Tribunal no sentido de que:
“a incorporação de imóvel de sócio a pessoa jurídica e forma sui generis de
alienação e não se confunde com nenhuma das hipóteses previstas no decreto-lei nº.
1.641/78 não se assemelha a compra e venda, adjudicação, doação,
desapropriação, etc. em qualquer destes hipóteses e presente o lucro, na
integralização posta em exame não resulta vantagem ou ganho”[19]. Assim, resta o convite
ao leitor para tal reflexão.
Por derradeiro, insta
destacar que os emolumentos deverão ser cobrados por matrícula de imóvel e de
acordo com o maior valor entre conferência de bens e certidão de valor venal[20].
Professor Tutor Fábio Pinheiro Gazzi
[1] Código Civil – artigos 45 e 967.
[2] Código Civil artigos 997, III e , bem
como Lei 6404/76 artigos 7º e 8º.
[3] Lei 6.015/73 – artigo 237.
[4] Código Civil – artigos 985 e 1.150.
Neste esteio importante mencionar parte da seguinte decisão a qual entendeu que
em sociedade entre cônjuges casados no regime de comunhão universal e que teve
o seu contrato registrado pela Junta Comercial, o Registrador de Imoveis não
poderá colocar obstáculos ao registro pela suposta invalidade de tal contrato: “ Em que pese a vedação, contida no
artigo 977 do Código Civil, de constituição de sociedade por cônjuges, entre si
ou com terceiros, quando casados pelo regime da comunhão universal ou da
separação legal de bens, não se trata, “in casu”, de registro de sociedade
civil a ser promovido por Oficial de Registro Civil de Pessoa Jurídica, sujeito
ao controle administrativo pelo Poder Judiciário... O registro pela Junta
Comercial produz, deveras, todos os efeitos que lhe são inerentes, em especial
o de conferir à sociedade personalidade jurídica própria que a habilita para
adquirir propriedade imóvel.... o
controle administrativo desse registro, porque atribuído à Junta Comercial, não
está inserido nos limites do presente procedimento de dúvida, que se destina ao
exame da possibilidade de ingresso, no fólio imobiliário, determinado título
aquisitivo e que não se presta para a obtenção, por via transversa, da
declaração de validade, ou não, de ato jurídico. Eventual questionamento a este
relativo deve, em razão de sua natureza, ser objeto de apreciação na via
jurisdicional, em processo contencioso, observados o contraditório e a ampla
defesa” (APELAÇÃO
CÍVEL Nº 1.054-6/5, j. 29.6.09 – CGJ SP)
[5] Lei de Registros Público – artigo
221, III e Lei 8934/94 artigo 64.
[6]
Constituição Federal artigo 156, § 2º, I e II e Código Tributário
Nacional artigo 36 e incisos.
[7](1) Acórdão CSM de 17/03/1998 – Fonte :041.449-0/9 -
São José do Rio Preto SP; (2) Acórdão _ DJ 452-6/4 -
Despachos/Pareceres/Decisões 45264/2005 CGJ SP; (3) Apelação Cível nº 0005121-97.2011.8.26.0236 (VOTO Nº
21.153) CGJ SP; (4) 0039109-22.2011.8.26.0071 CGJ SP
[8] Apelação Cível nº 535-6/3 CGJ SP.
[9] Lei 8245/91 - artigo 27.
[10] Apelação Cível n.º
0001685-55.2011.8.26.0358 CGJ SP. Sobre a outorga marital vide julgado Apelação Cível nº 1.234-6/7 de 17.5.2010 CGJ
SP o qual permitiu que tal anuência possa estar acostada no
contrato social nos termos do artigo 220 do Código Civil.
[11]
Apelação Cível n.º
0001685-55.2011.8.26.0358 CGJ SP e Apelação Cível n.º 0003562-82.2011.8.26.0664
CGJ SP
[12]
Apelação Cível 1.085-6/6, de 02/06/2009, Rel. Des. Ruy
Camilo) e Apelação Cível nº 990.10.509134-2 CGJ SP
[13]
Apelação Cível nº
990.10.509134-2 CGJ SP
[14] Ap. Civ. 074978-0/9, de 03/04/2001, rel. Des. Luís
de Macedo CGJ SP
[15] Apelação cível 530-6/0, de 20/07/2006,
rel. Des. Gilberto Passos de Freitas CGJ SP
[16] Apelação Cível nº 626-6/9, 26.3.09 –
CGJ SP
[17] Apelação Cível nº 538-6/7, 36.3.09 CGJ
SP e Apelação Cível nº 509-6/5, j 23.306 CGJ SP (por entender que a
integralização é forma de alienação). Destacamos
que não concordamos com este posicionamento, nos termos do REsp 22821 / PE,
j. 24/06/1992, Ministro GARCIA VIEIRA.
[18] AgRg no REsp 1.016.766/PR, Rel.
Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 13/03/2009, REsp 70.2915/RS, Rel.
Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJ 21/09/2007, REsp 867.276/RS, Rel.
Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJ 08/11/2006, REsp 789.004/RS, Rel.
Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira Turma, DJ 03/04/2006, REsp 660.692/SC,
Rel. Ministro Francisco Falcão, Primeira Turma, DJ 13/03/2006, REsp 260.499/RS, Rel. Ministro Milton Luiz
Pereira, Primeira Turma, DJ 13/12/2004
[19]
REsp 22821 / PE, j. 24/06/1992, Ministro GARCIA VIEIRA.
[20] Lei do Estado de São Paulo n.º 11.331,
de 26 de dezembro de 2002 - artigo 7º.