sábado, 27 de setembro de 2014

Auxílio-acidente

É um benefício pago ao trabalhador que sofreu um acidente e ficou com sequelas que reduzem sua capacidade de trabalho. É concedido para segurado que recebia auxílio-doença acidentário ou previdenciário.

Têm direito ao auxílio-acidente o trabalhador empregado, o trabalhador avulso e o segurador especial. O empregado doméstico, o contribuinte individual e o facultativo não possuem direito ao benefício.

Para concessão do auxílio acidente não é exigido tempo mínimo de contribuição, mas o trabalhador deve ter qualidade de segurado e comprovar a impossibilidade de continuar desempenhando as mesmas atividades, por meio de exame da perícia médica da Previdência Social.

O auxílio acidente, por ter caráter de indenização, pode ser acumulado com outros benefícios pagos pela Previdência Social exceto auxílio-doença decorrente da mesma lesão e aposentadorias. O benefício deixa de ser pago quando o trabalhador se aposenta ou quando solicita Certidão de Tempo de Contribuição-CTC do tempo de vinculação ao Regime Geral de Previdência Social para contagem em Regime Próprio de Previdência Social.

O benefício começa a ser pago a partir do dia seguinte em que cessa o auxílio doença. O valor corresponde a 50% do salário de benefício que deu origem ao auxílio-doença, corrigido até o mês anterior ao do início do auxílio-acidente.

 

Qualidade de segurado


Para ter direito aos benefícios da Previdência Social, o trabalhador precisa estar em dia com suas contribuições mensais, caso contrário, pode perder a qualidade de segurado.

Há situações em que os segurados ficam um período sem contribuir, mas continuam a ter direito aos benefícios previdenciários, enquanto mantiverem a qualidade de segurado.

Mantém a qualidade de segurado:

·         sem limite de prazo, quem estiver recebendo benefício;
·         por até 12 meses após o último pagamento das contribuições mensais (exceto facultativo(a)) ou após cessar o benefício por incapacidade. Esse prazo pode ser prorrogado por mais 12 meses se o trabalhador já tiver pago mais de 120 contribuições mensais sem interrupção que acarrete perda da qualidade de segurado  e/ou  poderão ser acrescidos de mais 12 meses para o trabalhador desempregado, desde que comprovada a situação por registro no Ministério do Trabalho e Emprego;
·         até 12 meses após cessar a segregação, para o segurado acometido de doença de segregação compulsória;
·         até 3 meses após o licenciamento para o segurado incorporado às Forças Armadas;
  • até 6 meses após interrompido o pagamento, para o segurado facultativo.

Observação:

A perda da qualidade de segurado não será considerada para a concessão das aposentadorias por tempo de contribuição e especial. Também não será considerada para a aposentadoria por idade, desde que o segurado conte com a carência e idade mínima exigidas.

Fonte: Previdência Social.


Professor Tutor Orlando Guarizi Junior

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

Cabe ao devedor, após quitação da dívida, providenciar o cancelamento do protesto.

A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que, no regime da Lei 9.492/97, cabe ao devedor, após a quitação da dívida, providenciar o cancelamento de protesto de título de crédito ou de outro documento de dívida, salvo inequívoca pactuação em sentido contrário.

A decisão, unânime, foi tomada em julgamento de recurso repetitivo relatado pelo ministro Luis Felipe Salomão. A tese passa a orientar os tribunais de segunda instância em recursos que discutem a mesma questão.

O recurso julgado no STJ veio de São Paulo. Um produtor rural ajuizou ação de indenização por danos morais e materiais contra o Varejão Casa da Maçã. Contou que emitiu cheque para pagar mercadoria adquirida no estabelecimento, mas não pôde honrar o pagamento, o que levou o cheque a protesto.

Disse ter quitado a dívida posteriormente, mas, ao tentar obter um financiamento para recuperação das pastagens de sua propriedade, constatou-se o protesto do cheque que já havia sido pago, sem que tenha sido promovido o respectivo cancelamento.

Sonho frustrado

O produtor alegou em juízo que a não concessão do financiamento, por ele ser “devedor de dívida já paga”, frustrou seus projetos e ainda lhe causou prejuízos materiais.

O juízo da 3ª Vara da Comarca de Araras não acolheu o pedido de indenização. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) manteve a sentença.

Em recurso especial, o produtor argumentou que a decisão do tribunal estadual seria contrária à jurisprudência do STJ, a qual, segundo ele, atribuiria ao credor e não ao devedor a responsabilidade pela baixa no protesto.

Interpretação temerária

Em seu voto, o ministro Salomão destacou que, como o artigo 26 da Lei 9.492/97 disciplina que o cancelamento do registro do protesto será solicitado mediante a apresentação do documento protestado, é possível inferir que o ônus do cancelamento é mesmo do devedor. 

Segundo ele, seria temerária para com os interesses do devedor e de eventuais coobrigados a interpretação de que, mesmo com a quitação da dívida, o título de crédito devesse permanecer em posse do credor.

“A documentação exigida para o cancelamento do protesto (título de crédito ou carta de anuência daquele que figurou no registro de protesto como credor) também permite concluir que, ordinariamente, não é o credor que providenciará o cancelamento do protesto”, disse o relator.

Com esses fundamentos, o ministro negou provimento ao recurso do produtor rural.

Fonte: Site do Superior Tribunal de Justiça


Professora Millena Franco Ribeiro

terça-feira, 23 de setembro de 2014

Pesquisa realizada pela FGV sobre os prazos procedimentais adotados por cada ministro do STF

Caros amigos,

Em tempos em que muito se discute sobre o ativismo judicial e meios alternativos de solução de litígio, o colunista Elio Gaspari destacou neste domingo (21.09), no matutino Folha de São Paulo, relevante pesquisa realizada pela FGV sobre os prazos procedimentais adotado por cada ministro do STF.

Assim sendo, gostaria de compartilhar com todos essa importante reflexão:


UM RETRATO DO SUPREMO TRIBUNAL
Durante um ano, uma equipe de nove pessoas da Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas do Rio, dirigida pelo professor Joaquim Falcão, estudou a tramitação de 1,5 milhão de processos e 14 milhões de procedimentos judiciais que tramitaram no Supremo Tribunal Federal entre 1988 e 2013.

Ela concluiu: "Os dados comprovam a urgência de que o Supremo repense sua relação com o tempo. (...) Boa parte dos indicadores mostra que o tempo não necessariamente é influenciado pela quantidade de processos que chegam aos ministros". (O processo relacionado ao uso de cinto de segurança em coletivos completou 17 anos e oito meses.)

Diz o estudo: "É preciso repensar a gestão dos processos do Supremo. A total autonomia de cada ministro sobre como decidir é inalienável, mas não pode ser confundida com uma total autonomia da gestão processual". (O ministro Nelson Jobim retinha processos para os quais pedia vista por uma média de mil dias. Seu colega Sydney Sanches devolvia-os em um mês.) O Brasil deve ser o único país onde um ministro pode travar o julgamento de um caso pedindo vista e levando o processo para seu gabinete. Em tese, a devolução deveria ocorrer em 30 dias. Em dezembro de 2013, na média, eles eram destravados depois de 346 dias. Um processo retido por 20 anos passou por três ministros e, quando foi julgado, o assunto estava prejudicado.

O Supremo não divulga a lista de liminares à espera de decisão do mérito. Liminares decididas liminarmente por Joaquim Barbosa esperaram oito anos pelo julgamento do mérito. Com a lista, seria possível acompanhar o serviço do ministro-relator e a organização dos presidentes do tribunal e de suas turmas.

Muitos tribunais divulgam suas pautas no início do ano. O STF não faz isso e fica todo mundo, inclusive os próprios ministros, pendurado na vontade do presidente da Casa. Pode-se acreditar que, em muitos casos, há método nessa desordem, mas, de uma maneira geral, o que há mesmo é desordem por falta de método.

A pesquisa, coordenada também pelos professores Ivar Hartmann e Vitor Chaves, traz duas boas notícias. A primeira é a de que o STF tem um banco de dados onde se pode garimpar estudos como esse. Não é pouca coisa, porque a primeira reação do dragão corporativo será sempre a de encerrar o debate sumindo com as informações.

A segunda é a de que a desordem vem de longe e os indicadores melhoraram. A média do tempo consumido à espera de uma decisão sobre uma liminar caiu 42% entre 2004 e 2013. O tempo para a publicação de acórdãos caiu em 79%.

TEORI ZAVASCKI
Está na corte há menos de dois anos, mas, se mantiver a média de desempenho, levará a taça da rapidez. Decide as liminares em 15 dias. Publica seus acórdãos em 23 dias. Nos dois casos, bem abaixo da média do tribunal. É também o ministro que por menos tempo retém os poucos processos para os quais pediu vista.

RICARDO LEWANDOWSKI
O presidente do STF decide as liminares em 17 dias e publica seus acórdãos em 55. Quando pede vista, retém o processo por mais de 200 dias. Se não tivesse essa marca, estaria entre os mais rápidos da Casa. Seu gabinete tem a chancela do ISO 9000, conferido a coisas que funcionam direito.

LUIZ FUX
É o lanterninha no tempo médio que leva para decidir uma liminar: 72 dias. Desde 1988, nenhum ministro demorou tanto. Está entre os mais rápidos na publicação de acórdãos, 41 dias. Depois do ministro Toffoli, tem a maior média de pedidos de vista. Entre os processos que reteve (habitualmente devolve-os em 180 dias), está a ação direta de inconstitucionalidade apresentada pela Procuradoria-Geral da República contra as gratificações de juízes do Rio. O processo está com ele desde 2012. Atualmente, tramita na Assembleia Legislativa um projeto que dá R$ 7.000 mensais aos juízes para a educação de seus filhos.

JOAQUIM BARBOSA
Decidiu as liminares em 21 dias e levou 117 para publicar seus acórdãos, ficando atrás de oito outros ministros. Seus pedidos de vista (um por mês) demoraram 300 dias.

ROBERTO BARROSO
Leva 31 dias para decidir uma liminar e 32 para publicar um acórdão. Pede um processo por mês e devolve-o em 45 dias.

CELSO DE MELLO
É o recordista na média do tempo que levou para publicar seus acórdãos: 679 dias. A partir de 2011, baixou drasticamente sua marca. As demoras de Celso de Mello viciaram a média da Casa, que ficou em 167 dias. Leva 45 dias para decidir uma liminar. É, de longe, o ministro que menos pede vistas, e devolve os processos em 200 dias.

CÁRMEN LÚCIA
Depois de Celso de Mello, é a ministra que faz menos pedidos de vista. É quem fica mais tempo com esses processos, numa média de 600 dias. Julga as liminares em 29 dias e publica seus acórdãos em 82.

DIAS TOFFOLI
É de longe quem mais pede vistas (mais de dois pedidos por mês), ficando com os processos por mais de 200 dias. Toffoli leva 59 dias para publicar um acórdão e 29 para decidir uma liminar.

MARCO AURÉLIO
Leva 173 dias para publicar um acórdão e 58 para decidir uma liminar. É um veterano da corte e está no bloco dos ministros que mais pedem vistas. Retém os processos por cerca de 200 dias.

GILMAR MENDES
Outro veterano, também está no bloco que mais pede vistas, com uma marca superior à de Marco Aurélio. Quando para um processo, a retenção fica, na média, em 400 dias. Suas liminares demoram 37 dias e seus acórdãos, 82.

ROSA WEBER
Decide suas liminares em 43 dias e publica acórdãos em 51. É a terceira colocada entre os que mais pedem vistas (depois de Toffoli e Fux), mas retém os processos numa marca inferior à deles, cerca de 140 dias.

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“A fulanização inevitável”

A desordem arcaica contamina o desempenho de muitos ministros, o que dá à fulanização aspectos contraditórios. Um ministro pode ser rápido numa coisa e lento em outra, simplesmente porque a máquina estimula lentidões e não incentiva a eficiência.

Nas duas colunas laterais está o desempenho dos onze ministros do Supremo (incluindo Joaquim Barbosa) em relação a três atividades que dependem só de cada um deles. São as seguintes:

1) O tempo que levam para conceder ou negar uma liminar. Não há prazo para que o façam. A média da corte é de 44 dias.

2) O tempo que levam para publicar seus votos, os chamados acórdãos. Enquanto o acórdão não é publicado, muitas decisões valem zero. O prazo regimental é de 60 dias, mas a média da corte está em 167.

3) A quantidade de pedidos de vista feitos por cada ministro e o tempo por que retêm o processo, quase sempre superior ao que determina o regimento do tribunal.

Em todos os casos, usaram-se médias.

Veja todos os relatórios do Supremo em Números: http://supremoemnumeros.fgv.br/


Professor Tutor Frederico Thales de Araújo Martos

UMA ANÁLISE DA EVOLUÇÃO DO DIREITO AMBIENTAL NO BRASIL

A evolução histórica do meio ambiente se inicia na Antiguidade, se consolidando com a formação dos Estados nacionais e, atualmente, desborda das fronteiras nacionais, passando a ser uma preocupação de toda a humanidade, estampada em declarações e tratados internacionais.
            A partir do século XVIII, a natureza passou a perder um pouco do seu caráter divino e intocável e, passou a ser um mecanismo de exploração do homem, em  busca   de   um   desenvolvimento  científico  e  econômico.
            No Brasil, o conceito de meio ambiente, surgiu com a Lei n. 6.938, de 31 de agosto de 1981, que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, a qual definiu o que é meio ambiente, nos seguintes termos:

Art. 3º. Para os fins previstos nesta Lei, entende-se por:
I – meio ambiente, o conjunto de condições, leis, influências e interações de ordem física, química e biológica, que permite, abriga e rege a vida em todas as suas formas.

            A Constituição da República Federativa do Brasil no artigo 225, “caput”, dispõe sobre o meio ambiente enunciando que, “Todos tem direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preserva-lo para as presentes e futuras gerações.”
            A Constituição Federal de 1988, além de definir o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como um bem comum da população impôs ao Poder Público e à sociedade o dever de protegê-lo e conserva-lo para as atuais e futuras gerações.
            Muito embora, haja uma concentração da matéria no art. 225, reservando-se a ela um capítulo da Ordem Social, a referência ao meio – ambiente permeia todo o texto constitucional.
            Inicia, quando introduz a defesa do meio ambiente pelo cidadão através da   ação popular (art. 5º, LXXIII), passando pela distribuição das competências  (arts. 23 e  24),  pela ação civil pública (art. 129, III), pela ordem econômica  (art. 170, V), pela   função social da propriedade (art. 186, II, c/c art. 184), pelo sistema de saúde (art. 200,   VIII), para desaguar no capítulo específico da Ordem Social (art. 225 e seus   parágrafos   e incisos).
            Um outro marco representativo, da inserção do direito ambiental no ordenamento jurídico brasileiro, foi a edição da Lei n. 9.650, de 12.02.1998, que dispõe sobre as sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente.
            O Novo Código Civil, que entrou em vigor em 11 de janeiro de 2003, inovou no que tange ao direito de propriedade, trazendo a função ambiental como elemento marcante daquele direito, dispondo em seu artigo 1.228, §1º que:

O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservadas, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas.

            Além de inserir a função social da propriedade, o novo Código Civil traz a função ambiental explicitada através do  desdobramento de vários de seus componentes.
            Assim sendo, pode-se concluir que, do ponto de vista puramente legislativo, o nosso país possui um arcabouço legislativo capaz de assegurar um mínimo de proteção legal ao meio ambiente. Porém, no campo da realidade, as normas ambientais não tem sido capazes de alcançar os objetivos que justificam sua existência, isso devido a pouca credibilidade dos órgãos ambientais e do Poder Judiciário, aliado à falta de consciência dos cidadãos que, desconsideram o meio ambiente como prioridade na qualidade de vida.

Referências:
- CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. São Paulo: Saraiva, 2014;

- Lei n. 6938/81 Disponível em: http://www.planalto.gov.br, Acesso em : 20 set. 2014, 15:00 hs;

- NOVO CÓDIGO CIVIL. São Paulo: Saraiva, 2014;

Professor Tutor Me. Rafael Altafin Galli


segunda-feira, 15 de setembro de 2014

A recusa do ingresso de pessoa idosa no plano de saúde é ilegal!

Com a crescente escassez de operadoras que comercializam planos individuais no mercado, a contratação de planos coletivos por adesão ou empresariais são, cada vez mais, opções atrativas para os consumidores que não têm plano de saúde, ou que pretendem mudar o plano que atualmente possuem.

No entanto, as pessoas idosas têm se deparado com uma prática que é cada vez mais comum no mercado, qual seja, a imposição, por parte da operadora, de muitos empecilhos para a realização da contratação. Em muitos casos a situação é tão grave que a operadora chega a recusar a adesão do consumidor, sob a alegação de que não aceita pessoas com mais de 59 anos.

Trata-se, todavia, de prática odiosa e que é expressamente proibida pela nossa legislação em todas as suas vertentes. Inicialmente, faz-se mister mencionar que a Constituição Federal de 1988, que é a norma jurídica de maior hierarquia em nosso ordenamento, possui como princípio basilar a “dignidade da pessoa humana” (CF, art. 01.º, inc. III) e ainda, prevê dentre seus objetivos primordiais, a construção de uma sociedade “livre, justa e solidária” (CF, art. 3.º, inc.I) e a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” (CF, art. 3.º, inc. IV). O legislador constituinte faz constar, ainda, na cabeça do art. 5.º, que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”.

Nesse sentido, a simples leitura dos referidos artigos do texto constitucional já mostra que qualquer tipo de discriminação que tenha por base categorias meramente subjetivas constitui conduta incompatível com os fundamentos e objetivos da nossa República.

Mas no que tange à pessoa idosa, tanto o legislador constituinte, quanto a legislação infraconstitucional, tiveram um cuidado especial. Com efeito, a preocupação em garantir a proteção à pessoa idosa está expressa no art. 230, da Constituição Federal, que confere ao Estado o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida”. E, visando regulamentar de forma específica o significado da defesa da “dignidade e bem-estar” dos idosos, foi editada a Lei n.º 10.741/03, também conhecida como Estatuto do Idoso, a qual, em seu artigo 4.º, proibiu categoricamente a efetivação de qualquer prática discriminatória contra a pessoa idosa.

Os artigos constitucionais e do Estatuto do Idoso mencionados, por si só, já bastariam para concluir que a recusa de contratação com pessoa idosa é ilegal. Mas, por se tratar de relação de consumo, regulamentada, portanto, pelo Código de Defesa do Consumidor (Súmula 469 do SJT), existe previsão normativa específica que caracteriza como “prática abusiva” a recusa de prestação de serviços ao consumidor que se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento (CDC, art. 39, inc. IX).

A esse respeito, ensina BRUNO MIRAGEM que “o fornecedor [de serviços] não pode, ao se dispor a enfrentar os riscos da atividade negocial no mercado de consumo, pretender selecionar os consumidores com quem vai contratar(...).Assim, ocorrerá prática abusiva, por exemplo, quando o fornecedor a fornecer (...) por discriminação ilícita de determinado consumidor. (MIRAGEM, Bruno. Direito do Consumidor. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 188).

Atenta à proibição estabelecida pela legislação consumerista, a Lei n.º 9.656/98 determinou, em seu art. 14, que o consumidor não pode ser impedido de participar de planos privados de assistência à saúde em razão da idade avançada. No mesmo sentido, a Agência Nacional de Saúde Suplementar, ao editar a Resolução Normativa n.º 195, que regulamenta a atividade dos planos de saúde empresariais e coletivos por adesão, fez constar expressamente a chamada “Proibição de Seleção de Riscos”. Mas o que seria a proibição de seleção de riscos?

A referida proibição significa que, para o ingresso em plano de saúde coletivo por adesão ou empresarial, a operadora de plano de saúde somente pode exigir do consumidor a existência de vínculo com a pessoa jurídica que figura como estipulante do contrato, ou seja, o consumidor que pretenda aderir a um plano coletivo por adesão somente precisa comprovar o vínculo com pessoa jurídica de caráter profissional, classista ou setorial (RN 195/09, art. 09.º), ou, se pretender ingressar em plano empresarial, deve apresentar documentação que demonstre a existência vínculo empregatício ou estatutário, ou a condição de sócio e/ou administrador da empresa estipulante.

Recentemente, a questão da recusa de contratação de plano de saúde em razão da idade foi analisada pela 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do Distrito Federal, que reconheceu a abusividade desta conduta e, ainda, condenou a operadora no pagamento de danos morais, senão vejamos:

CDC. NEGATIVA DE EFETIVAÇÃO DA PROPOSTA DE CONTRATAÇÃO DE PLANO DE SAÚDE TÃO SOMENTE PELA IDADE DA CONSUMIDORA. AUSÊNCIA DE CLARA INFORMAÇÃO. LEGÍTIMA EXPECTATIVA GERADA QUANDO DA REALIZAÇÃO DA PROPOSTA. DANO MORAL CARACTERIZADO. IMPOSSIBILIDADE DE REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE NA INDENIZAÇÃO FIXADA EM R$ 1.500,00 (HUM MIL E QUINHENTOS REAIS). RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. 
1. Restou evidenciado nos autos que a proposta de cobertura de plano de saúde vendida pela corretora de seguros foi negada sem a devida informação ao consumidor, o que configura fato gerador de dano moral, na modalidade damnum in re ipsa, pois suplanta liame de mero dissabor, irritação ou mágoa, para ingressar e interferir de forma intensa na dignidade da pessoa humana. A responsabilidade do recorrente é objetiva, na forma do artigo 14 do CDC. 
2. Os critérios considerados pelo MM. Juiz, ao quantificar o valor da indenização por danos morais no patamar de R$ 1.500,00, estão de acordo com a orientação da doutrina e da jurisprudência, razão pela qual não merecem reforma. 
3. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. O recorrente deverá arcar com o pagamento das custas e deixo de arbitrar honorários advocatícios ante a ausência de contrarrazões. 
(
Acórdão n.611978, 20120510005865ACJ, Relator: JOSÉ GUILHERME, 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do DF, Data de Julgamento: 07/08/2012, Publicado no DJE: 24/08/2012. Pág.: 298)
Assim, o prestador de serviços não pode “escolher” com que vai contratar. Demonstrada a existência de vínculo com a pessoa jurídica estipulante, a recusa da contratação por parte da operadora de plano de saúde reveste-se de ilegalidade e, inclusive, poderá ser caracterizada como crime se restar comprovado que a recusa se deu em discriminação à pessoa idosa (Estatuto do Idoso, art. 96[1]).

Professor Tutor MARCOS PAULO FALCONE PATULLO





[1] Art. 96. Discriminar pessoa idosa, impedindo ou dificultando seu acesso a operações bancárias, aos meios de transporte, ao direito de contratar ou por qualquer outro meio ou instrumento necessário ao exercício da cidadania, por motivo de idade:Pena – reclusão de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa.

A recusa do ingresso de pessoa idosa no plano de saúde é ilegal!

Com a crescente escassez de operadoras que comercializam planos individuais no mercado, a contratação de planos coletivos por adesão ou empresariais são, cada vez mais, opções atrativas para os consumidores que não têm plano de saúde, ou que pretendem mudar o plano que atualmente possuem.

No entanto, as pessoas idosas têm se deparado com uma prática que é cada vez mais comum no mercado, qual seja, a imposição, por parte da operadora, de muitos empecilhos para a realização da contratação. Em muitos casos a situação é tão grave que a operadora chega a recusar a adesão do consumidor, sob a alegação de que não aceita pessoas com mais de 59 anos.

Trata-se, todavia, de prática odiosa e que é expressamente proibida pela nossa legislação em todas as suas vertentes. Inicialmente, faz-se mister mencionar que a Constituição Federal de 1988, que é a norma jurídica de maior hierarquia em nosso ordenamento, possui como princípio basilar a “dignidade da pessoa humana” (CF, art. 01.º, inc. III) e ainda, prevê dentre seus objetivos primordiais, a construção de uma sociedade “livre, justa e solidária” (CF, art. 3.º, inc.I) e a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação” (CF, art. 3.º, inc. IV). O legislador constituinte faz constar, ainda, na cabeça do art. 5.º, que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”.

Nesse sentido, a simples leitura dos referidos artigos do texto constitucional já mostra que qualquer tipo de discriminação que tenha por base categorias meramente subjetivas constitui conduta incompatível com os fundamentos e objetivos da nossa República.

Mas no que tange à pessoa idosa, tanto o legislador constituinte, quanto a legislação infraconstitucional, tiveram um cuidado especial. Com efeito, a preocupação em garantir a proteção à pessoa idosa está expressa no art. 230, da Constituição Federal, que confere ao Estado o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida”. E, visando regulamentar de forma específica o significado da defesa da “dignidade e bem-estar” dos idosos, foi editada a Lei n.º 10.741/03, também conhecida como Estatuto do Idoso, a qual, em seu artigo 4.º, proibiu categoricamente a efetivação de qualquer prática discriminatória contra a pessoa idosa.

Os artigos constitucionais e do Estatuto do Idoso mencionados, por si só, já bastariam para concluir que a recusa de contratação com pessoa idosa é ilegal. Mas, por se tratar de relação de consumo, regulamentada, portanto, pelo Código de Defesa do Consumidor (Súmula 469 do SJT), existe previsão normativa específica que caracteriza como “prática abusiva” a recusa de prestação de serviços ao consumidor que se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento (CDC, art. 39, inc. IX).

A esse respeito, ensina BRUNO MIRAGEM que “o fornecedor [de serviços] não pode, ao se dispor a enfrentar os riscos da atividade negocial no mercado de consumo, pretender selecionar os consumidores com quem vai contratar(...).Assim, ocorrerá prática abusiva, por exemplo, quando o fornecedor a fornecer (...) por discriminação ilícita de determinado consumidor. (MIRAGEM, Bruno. Direito do Consumidor. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 188).

Atenta à proibição estabelecida pela legislação consumerista, a Lei n.º 9.656/98 determinou, em seu art. 14, que o consumidor não pode ser impedido de participar de planos privados de assistência à saúde em razão da idade avançada. No mesmo sentido, a Agência Nacional de Saúde Suplementar, ao editar a Resolução Normativa n.º 195, que regulamenta a atividade dos planos de saúde empresariais e coletivos por adesão, fez constar expressamente a chamada “Proibição de Seleção de Riscos”. Mas o que seria a proibição de seleção de riscos?

A referida proibição significa que, para o ingresso em plano de saúde coletivo por adesão ou empresarial, a operadora de plano de saúde somente pode exigir do consumidor a existência de vínculo com a pessoa jurídica que figura como estipulante do contrato, ou seja, o consumidor que pretenda aderir a um plano coletivo por adesão somente precisa comprovar o vínculo com pessoa jurídica de caráter profissional, classista ou setorial (RN 195/09, art. 09.º), ou, se pretender ingressar em plano empresarial, deve apresentar documentação que demonstre a existência vínculo empregatício ou estatutário, ou a condição de sócio e/ou administrador da empresa estipulante.

Recentemente, a questão da recusa de contratação de plano de saúde em razão da idade foi analisada pela 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do Distrito Federal, que reconheceu a abusividade desta conduta e, ainda, condenou a operadora no pagamento de danos morais, senão vejamos:

CDC. NEGATIVA DE EFETIVAÇÃO DA PROPOSTA DE CONTRATAÇÃO DE PLANO DE SAÚDE TÃO SOMENTE PELA IDADE DA CONSUMIDORA. AUSÊNCIA DE CLARA INFORMAÇÃO. LEGÍTIMA EXPECTATIVA GERADA QUANDO DA REALIZAÇÃO DA PROPOSTA. DANO MORAL CARACTERIZADO. IMPOSSIBILIDADE DE REDUÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO. PROPORCIONALIDADE E RAZOABILIDADE NA INDENIZAÇÃO FIXADA EM R$ 1.500,00 (HUM MIL E QUINHENTOS REAIS). RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. 
1. Restou evidenciado nos autos que a proposta de cobertura de plano de saúde vendida pela corretora de seguros foi negada sem a devida informação ao consumidor, o que configura fato gerador de dano moral, na modalidade damnum in re ipsa, pois suplanta liame de mero dissabor, irritação ou mágoa, para ingressar e interferir de forma intensa na dignidade da pessoa humana. A responsabilidade do recorrente é objetiva, na forma do artigo 14 do CDC. 
2. Os critérios considerados pelo MM. Juiz, ao quantificar o valor da indenização por danos morais no patamar de R$ 1.500,00, estão de acordo com a orientação da doutrina e da jurisprudência, razão pela qual não merecem reforma. 
3. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. O recorrente deverá arcar com o pagamento das custas e deixo de arbitrar honorários advocatícios ante a ausência de contrarrazões. 
(
Acórdão n.611978, 20120510005865ACJ, Relator: JOSÉ GUILHERME, 2ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do DF, Data de Julgamento: 07/08/2012, Publicado no DJE: 24/08/2012. Pág.: 298)
Assim, o prestador de serviços não pode “escolher” com que vai contratar. Demonstrada a existência de vínculo com a pessoa jurídica estipulante, a recusa da contratação por parte da operadora de plano de saúde reveste-se de ilegalidade e, inclusive, poderá ser caracterizada como crime se restar comprovado que a recusa se deu em discriminação à pessoa idosa (Estatuto do Idoso, art. 96[1]).

Professor Tutor MARCOS PAULO FALCONE PATULLO





[1] Art. 96. Discriminar pessoa idosa, impedindo ou dificultando seu acesso a operações bancárias, aos meios de transporte, ao direito de contratar ou por qualquer outro meio ou instrumento necessário ao exercício da cidadania, por motivo de idade:Pena – reclusão de 6 (seis) meses a 1 (um) ano e multa.

A SÚMULA VINCULANTE E OS SEUS EFEITOS NO CONTROLE DIFUSO DE CONSTITUCIONALIDADE: UM ESTUDO A PARTIR DO ´NEO´CONSTITUCIONALISMO

A súmula representa o posicionamento predominante de um tribunal (estadual ou federal) sobre determinada questão jurídica, tendo seu enunciando apenas caráter persuasivo.[1] A EC n. 45/2004, no entanto, introduziu na ordem jurídica constitucional a súmula com efeito vinculante, autorizando que o Supremo Tribunal Federal a edite sobre questões constitucionais, pelo que os demais órgãos judicantes e a Administração Pública devem obediência ao comando do seu enunciado, ou seja, o aludido instrumento normativo, trazendo à baila a “reforma do judiciário”, acrescentou à Constituição o artigo 103-A da Constituição Federal de 1988, introduzindo na nossa ordem jurídica constitucional a súmula[2] vinculante. Da leitura do sobredito dispositivo constitucional, infere-se, de plano, que a edição de súmula vinculante pelo Supremo Tribunal Federal exige a conjugação de dois requisitos: a) aprovação de 2/3 (dois terços) de seus membros; b) decisões reiteradas sobre idêntica questão constitucional. Com efeito, a edição de uma súmula vinculante impede não só que essa mesma questão seja levada novamente ao conhecimento do Supremo Tribunal Federal, como também obriga que sua decisão seja dotada de força vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e da Administração Pública.
Portanto, no Brasil, o surgimento da súmula vinculante é mais um fator para “objetivação” ou “dessubjetivação” do controle difuso. Sim, porque essa figura é o retrato da evolução do pensamento jurídico no contexto dos efeitos do controle de constitucionalidade difuso, desde a criação da figura da resolução do Senado, o que demonstra a preocupação do nosso ordenamento de tentar generalizar as decisões do Supremo Tribunal Federal em de sede de controle concreto. Em outras palavras, a proposta visa a uniformizar os temas de natureza constitucional entre os órgãos judiciários ou entre estes e a Administração Pública, em um quadro de aproximação do modelo difuso-concreto de constitucionalidade com a jurisdição constitucional concentrada, como se entre eles existissem uma ponte de conexão unida, dentre outros, pelo instituto das súmulas. Deveras, a súmula vinculante, na lição de André Ramos Tavares (2012, p.437) deve ser compreendida como processo objetivo característico que serve para aproximar o controle difuso-concreto de constitucionalidade (reiteradas decisões) do controle abstrato-concentrado (efeito vinculante). Dessa forma, passa-se a sustentar, diante desse novel entendimento, que uma decisão promanada do Supremo Tribunal Federal em sede de controle difuso pode ter a mesma eficácia que uma proferida em controle concentrado.
Tal procedimento sumular, com eficácia vinculante, evidencia a certeza do direito, traduzida no princípio da segurança jurídica. Mesmo porque não se faz justiça com julgamentos lentos e ineficazes.
Muitos poderiam dizer que o método do respeito obrigatório aos precedentes (stare decisis et non quieta movere, ou seja, mantenha-se a decisão e não se pertube o que já foi decidido) é incompatível com o sistema do civil law. De fato, o precedente constitui uma importante fonte do direito da common law. Enquanto o juiz da civil law se circunscrevia à mecânica aplicação da lei, o juiz da tradição da common law criava o direito.
Como vivemos em um ambiente marcado pelo ‘neo’constitucionalismo, movimento esse que foi responsável por deslocar a Constituição para o centro do sistema jurídico, muitos temas foram constitucionalizados. E nesse novo cenário, as normas jurídicas já não são capazes de trazer em seu relato abstrato a solução para todos os problemas. O marco filosófico do ‘neo’constitucionalismo (pós-positivismo) realça a proatividade dos juízes em torno da necessidade de participar ativamente do processo de criação do direito. Essa proposta abre caminho para um conjunto amplo e ainda incompleto de reflexões acerca do atual papel do Supremo Tribunal Federal, que passa a protagonizar uma série de ações construtivas do direito constitucional. Tanto é verdade que o Tribunal, de há muito, vem utilizando as técnicas de interpretação conforme e declaração parcial de nulidade sem redução de texto, para dar sentido diverso do que é conferido pelo Legislador.
Enfim, tal situação própria do pós-positivismo evidencia a mudança de paradigma jurídico tradicional, assim qualificado pelo deslocamento da lei para o juiz, o qual deve completar a solução inicialmente relatada pelo texto normativo, mediante a ponderação dos interesses envolvidos, já que, em uma ordem pluralista, existem diversos princípios que abrigam valores ou fundamentos diversos, aparentemente contrapostos, sendo certo que o intérprete deve, à vista dos elementos do caso concreto, fazer escolhas fundamentadas, quando se defronte com antagonismos inevitáveis (BARROSO, 2014, p.21-22). Essa visão pós-positivista e principiológica do Direito impõe uma postura diferente do juiz, elevando-o, sob a condição de verdadeiro intérprete, a uma função criativa do direito.
Com isso, se o juiz não mais desempenha meramente uma função técnica de conhecimento, e, portanto, se sua decisão não mais se insere tão-somente dentro de um processo silogístico de subsunção do caso concreto à norma, cabendo-lhe exercer a função criativa do caso concreto, indaga-se, se em nome do livre convencimento dos juízes, estariam eles livres para julgar, mesmo que suas decisões estivessem em flagrante desconformidade com a orientação predominante?
Ora, parece-nos que o novo pensamento constitucional impulsionado pelo pós-positivismo não dá espaços a qualquer tipo de atitude “decisionista” e práticas voluntárias iníquas, de matizes diversos, que, pondo em risco a segurança jurídica e a igualdade dos jurisdicionados, culminam no desmoronamento do próprio sistema jurídico do qual faz parte e debilitam, em última análise, a força normativa da Constituição.[3] Não se pode engendrar o mesmo mal (insegurança jurídica) que se pretende combater. Por isso mesmo, a decisão deve ser resultado de um sistema, servindo a Constituição como instrumento delimitador da atuação criativa do intérprete, por meio de um conjunto vertiginoso de normas princípiológicas que o orientarão sua escolha, e o Supremo Tribunal Federal com órgão controlador dessa prática.
E nesse quadro de controvérsias e tergiversações, no qual o jurisdicionado fica sujeito à “loteria das decisões judiciais” (MANCUSO, 2007, p.150), surge uma alternativa para o combate da instabilidade e inefetividade do sistema jurídico: a fórmula do respeito obrigatório aos precedentes judiciais. 

Professor Tutor Mateus Pieroni Santini

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARROSO, Luis Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalismo do direito (o triunfo tardio do direito constitucional no Brasil). Revista Eletrônica sobre a Reforma do Estado (RERE). Salvador, Instituto de Direito Público, n. 9, março/abril/maio 2007. Disponível em <http://www.direitodoestado.com.br/rere.asp>. Acesso em: 02 set. 2014.

MANCUSO, Rodolfo de Camargo. Divergência jurisprudencial e súmula vinculante. 3.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007. 

MELLO, Alessandra Lopes Santana de. A ideologia do caso concreto e a segurança jurídica. Revista de Direito Constitucional e Internacional (RDCI). São Paulo, n.77, ano 19, out./dez. 2011.

TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucional. 10.ed. São Paulo: Saraiva, 2012.
STRECK, Lenio Luiz. Jurisdição constitucional e hermenêutica: uma nova crítica do direito. 2.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. 






[1] No common law, todas as deduções consideradas não essenciais de um julgamento pelo Tribunal inserem-se dentro daquilo que o rigor técnico anglo-saxão denomina de dictum (singular) ou dicta (plural), assim consideradas afirmações jurídicas, com efeito de caráter não obrigatório (persuasivo), que, a despeito de constar no corpo da decisão, são prescindíveis ao julgamento da causa.
[2] O nosso ordenamento jurídico prevê, no artigo 518, §1º, graças à redação dada pela Lei n. 11.276/2006, a chamada súmula impeditiva de recurso, segundo a qual o juiz não recebe o recurso de apelação em virtude de sua sentença estar em conformidade com súmula do Superior Tribunal de Justiça ou Supremo Tribunal Federal. Ademais, nos termos do artigo 557, caput, do CPC o relator não dará seguimento a recurso manifestamente em confronto com súmula ou com jurisprudência dominante do STF, ou de Tribunal Superior. De outro giro, segundo o §1º do mesmo dispositivo, se a decisão recorrida estiver em manifesta desconformidade com súmula ou jurisprudência dominante do STF, ou de Tribunal Superior, o relator poderá dar provimento ao recurso. Por fim, conforme artigo 543-C do CPC, “quando houver multiplicidade de recursos com fundamento em idêntica questão de Direito, o recurso especial será processado nos termos deste artigo. §1º. Caberá ao Presidente do tribunal de origem admitir um ou mais recursos representativos da controvérsia, os quais serão encaminhados ao STJ, ficando suspensos os demais recursos especiais até o pronunciamento definitivo do STJ. §2º. Não adotada a providência descrita no §1º deste artigo, o relator no STJ, ao identificar que sobre a controvérsia já existe jurisprudência dominante ou que a matéria já está afeta ao colegiado, poderá determinar a suspensão, nos tribunais de segunda instância, dos recursos nos quais a controvérsia esteja estabelecida”.   
[3] Esse entendimento foi, igualmente, encampado por Alessandra Lopes Santana de Mello (2011, p.87), para quem a “tarefa criativa do juiz na busca do justo, tão festejada e colimada hodiernamente, não lhe autoriza incorrer em ‘decisionismos’ ou arbitrariedades, como se ele juiz, não integrasse um sistema que deve ser harmônico e coerente. A legitimidade de uma interpretação judicial decorre do emprego de uma fundamentação jurídica que possa ser generalizada aos casos equiparáveis, que tenha pretensão de universidade e leve em conta as consequências práticas que sua decisão produzirá no mundo dos fatos. [...] A efetividade do sistema jurídico depende da confiança dos jurisdicionados na função judicial e da capacidade dos cidadãos em entever os resultados das lides judiciais. Não basta conhecer o Direito legislado. Há que conhecer o Direito aplicado e, para tanto, deve haver a uniformidade da interpretação/aplicação das normas jurídicas” (grifos no original).  

terça-feira, 2 de setembro de 2014

Da fraude à execução fiscal e o art. 185 do CTN

Na execução fiscal, a satisfação do crédito tributário é garantida por meio do patrimônio do contribuinte devedor.

Contudo, se no decorrer do processo, o contribuinte promover a alienação de seu patrimônio, poderá o Fisco formular um pedido para declaração de fraude à execução, o que poderá tornar sem eficácia os atos promovidos pelo executado relativamente ao patrimônio objeto de transação.

O art. 185 do CTN, com a modificação dada pela Lei Complementar nº 118/2005, disciplina a fraude à execução fiscal. Vejamos:

 Art. 185. Presume-se fraudulenta a alienação ou oneração de bens ou rendas, ou seu começo, por sujeito passivo em débito para com a Fazenda Pública, por crédito tributário regularmente inscrito como dívida ativa”.

Para o Fisco, presume-se a fraude já com a inscrição do débito em Dívida Ativa, sem necessidade de ciência do contribuinte do processo de execução.

Os tribunais vêm reconhecendo referida presunção.  A posição adotada é no sentido de que o seu afastamento só seria cabível caso o executado tivesse outros bens suficientes para satisfazer, na integralidade, a dívida fiscal.

Com a figura da presunção absoluta de fraude, cria-se ao executado a dificuldade de produção de prova em contrário.

Vale dizer, não se conhece os fatos e em que condições o comprador e o vendedor (executado) realizaram a alienação do imóvel.

Portanto, tanto a Fazenda Pública, como os tribunais adotam a presunção absoluta de fraude à execução fiscal, sem que se comprove se houve má-fé das partes envolvidas no negócio.

Defendem que o crédito tributário obedece ao princípio da supremacia do interesse público, já que o recolhimento dos tributos serve à satisfação das necessidades coletivas, não se investigando da boa-fé dos envolvidos, tratada no âmbito das execuções comuns. 
 
Neste sentido, segue julgado do STJ:

Ementa: PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. EMBARGOS DECLARATÓRIOS RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL. INSTRUMENTALIDADE RECURSAL. DESAPROPRIAÇÃO. DÚVIDA SOBRE O DOMÍNIO DO BEM EXPROPRIADO. RETENSÃO DA INDENIZAÇÃO. INCERTEZA DA PROPRIEDADE. SÚMULA 7/STJ. 1. Quando os embargos declaratórios são utilizados na pretensão de revolver todo o julgado, com nítido caráter modificativo, podem ser conhecidos como agravo regimental, em vista da instrumentalidade e da celeridade processual. 2. A Primeira Seção, no julgamento do REsp 1.141.990/PR, de relatoria do Ministro Luiz Fux, submetido ao rito dos recursos repetitivos (art. 543-C do CPC), sedimentou o entendimento de que gera presunção absoluta (jure et de jure) de fraude à execução a simples alienação ou oneração de bens ou rendas pelo sujeito passivo por quantia inscrita em dívida ativa, sem a reserva de meios para quitação do débito, destacando-se, no julgado que "a alienação efetivada antes da entrada em vigor da LC n. 118/2005 (09.06.2005) presumia-se em fraude à execução se o negócio jurídico sucedesse a citação válida do devedor; posteriormente à 09.06.2005, consideram-se fraudulentas as alienações efetuadas pelo devedor fiscal após a inscrição do crédito tributário na dívida ativa". 3. Assentou-se ainda que a lei especial, qual seja, o Código Tributário Nacional, se sobrepõe ao regime do direito processual civil, não se aplicando às execuções fiscais o tratamento dispensado à fraude civil, diante da supremacia do interesse público, já que o recolhimento dos tributos serve à satisfação das necessidades coletivas. 4. Assim, no que se refere à fraude à execução fiscal, deve ser observado o disposto no art. 185 do CTN. Antes da alteração da Lei Complementar n. 118/2005, pressupõe-se fraude à execução a alienação de bens do devedor já citado em execução fiscal. Com a vigência do normativo complementar, em 8.5.2005, a presunção de fraude ocorre quando já existente a inscrição do débito em dívida ativa. 5. Alienado o bem após a citação, suscita-se tese de que há outros bens suficientes à quitação do débito fiscal, o que afastaria a fraude à execução. O Tribunal de origem não reconheceu a liquidez destes. Conclusão contrária demandaria incursão na seara fática dos autos, o que refoge à legitimidade constitucionalmente outorgada ao STJ, por não atuar como terceira instância revisora ou tribunal de apelação reiterada. Inafastável incidência da Súmula 7/STJ. Embargos de declaração conhecidos como agravo regimental, mas improvido. (EDcl no AREsp 497776/RS, EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL 2014/0076768-5, 2ª T., rel. Min. Humberto Martins, j. 03-06-2014) (grifos nossos).

O tema merece debate. No caso, fica evidenciada a violação ao princípio da segurança jurídica?


Professora tutora Liliane Ayala