quarta-feira, 14 de junho de 2017

A hostilidade no meio ambiente de trabalho

A hostilidade no meio ambiente de trabalho

Michelle C B Teixeira Pittman*
A violência é poder de destruição, desencadeadora de uma energia devastadora, capaz de produzir perturbações traumáticas, ou até mesmo fatais.
Pequenos atos perversos são tão corriqueiros que parecem normais.
A violência perversa só percebe quem a sofre. O ataque destrói diretamente a saúde mental do indivíduo, que é fundamental na construção de sua individualidade, e do reconhecimento de seu empenho no trabalho bem desenvolvido, no ambiente laboral.
O fenômeno da violência no trabalho tem chamado a atenção de várias áreas do conhecimento científico, como por exemplo médicos e psicólogos, de modo a refletir sobre os fenômenos provenientes do universo do trabalho, dentre eles o assédio moral[1].
Algumas ações destacam-se por configurarem violência no trabalho, e que não necessariamente se restringem a ações de natureza física, podendo citar: assediar, isolar, enviar mensagens ofensivas, excluir, gesticular rudemente, ameaçar, sabotar, intimidar, danificar, oprimir, gritar, xingar, constranger, dentre outras[2].
As agressões nem sempre são humilhantes ou constrangedoras se tomadas isoladamente, ou seja, fora de sua contextualização. Neste sentido ressalta Valérie Malaba que “poderão caracterizar atos de assédio as decisões normais nas relações de trabalho, mas que em razão de seu contexto, de suas circunstâncias, de seu modo de execução ou de sua repetição tendam a degenerar as condições de trabalho”[3].
Pierre Bourdieu denominou como violência simbólica as relações de dominação, sem o uso da coerção física, aplicadas em relações entre pessoas e grupos pertencentes à uma sociedade[4].
A ligação entre meio ambiente e direito a dignidade, revela a busca do homem de viver em um ambiente não degradado, o qual garanta seus direitos fundamentais.
Os direitos fundamentais são direitos históricos, consagrados ao longo do tempo. Nesse sentido afirma Bobbio[5]:

Os direitos fundamentais são direitos históricos. Isso significa que a consagração dos mesmos não se deu de uma vez só, porém fez parte da luta humana na afirmação de si em face do poder social, em especial o institucionalizado e politicamente organizado (o Estado).

O respeito ao meio ambiente do trabalho é o mesmo que respeitar a saúde e segurança do trabalhador. Caso contrário o princípio da dignidade humana não encontra expressão. Uma vez que o trabalhador não é uma coisa, mero fator de produção que aliena a sua força de trabalho ao capital. Este é um ser mundano, detentor de subjetividade, e deve ser respeitado como indivíduo, sujeito de direito à integridade física e mental no local laboral com extensão a todo âmbito em que vive.
A transformação da ordem econômica resultada pela Revolução Industrial colocou o homem como objeto de exploração. E mesmo após a Segunda Guerra Mundial com o advento da Declaração dos Direitos Humanos, o objetivo de conferir maior valor ao ser humano, ainda está longe de ser alcançado em sua ideação[6].
 Ignorar a dignidade humana do trabalhador é incorrer em afronta do artigo 1ª, incisos III e IV, da Constituição Federal no Brasil de 1988[7].
O artigo 225, caput, do mesmo instituto trata do meio ambiente, onde estabelece direitos ao meio ambiente de trabalho digno e equilibrado[8]. 
Dignidade esta que não é valorável ou substituível. Não tem preço. Desta forma, inconcebível é qualquer justificativa ou argumentação que desonere o agressor, ao tornar ou permitir que sua vítima seja alijada do meio ambiente de trabalho através do assédio moral.
É a combinação caótica de diferentes riscos visíveis ou invisíveis no ambiente e nas condições de trabalho que levam os trabalhadores a adoecer, a pedir afastamento do ambiente de trabalho e a desistir da própria vida[9].
Uma vez aplicado os princípios e direitos básicos previstos em nossa Carta Magna ao direito ambiental nas relações de trabalho, especialmente ao que se refere a proteção da saúde física e mental do trabalhador, alcança-se a dignidade da pessoa humana, respeitando à saúde e segurança do trabalhador, sem desperdício do potencial humano.







* Mestre em Direito, pela Escola Paulista de Direito. Advogada. Possui graduação em Direito pela Faculdade de Direito de Itu. Especialista nas áreas do Direito Público, com MBA em Gestão Educacional. Graduanda em Psicologia. Atualmente é Professora nos Cursos de Pós-Graduação Centro Universitário Anhanguera/ Rede de Ensino Luiz Flávio Gomes. Tutora em EaD na Universidade Federal de São Paulo - Núcleo (UDED). Tem experiência na área de Direito, com ênfase em Direito do Trabalho, e também em ensino superior presencial e na modalidade EaD há 10 anos.
[1] GARCIA. I. S.; TOLFO, S. DA R. Assédio moral no trabalho: culpa e vergonha pela humilhação social. Curitiba: Juruá, 2011, p. 32.
[2] SOARES, Leandro Q. Interações socioprofissionais e assédio moral no trabalho. São Paulo: Casa do Psicólogo. 2008, p. 31.
[3] MALABAT, Valérie. À la recherche du sens du droit pénal du harcèlement. In: Droit Social, n. 5, maio 2003, p. 496.
[4] BOURDIEU, Pierre. Meditações pascalinas. Rio de Janeiro: Beltrand, 2001, p. 47.
[5] BOBBIO. Norberto. A era dos direitos. 8 ed. Tradução Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 1992, p.5.
[6] OLIVEIRA, Antonio Carlos Paula de. Revista pessoal de empregado: exercício, limite, abuso. São Paulo: LTr, 2011, p. 46.
[7] Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: [...] III - a dignidade da pessoa humana; IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa; [...].
[8] Art. 225. Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
[9] BARRETO, M.; FREITAS, M. E de.; HELOANI, R. Assédio moral no trabalho. São Paulo: Cengage Learning Produções Ltda, 2008, p.69.