terça-feira, 26 de maio de 2015

LIMITE PENAL - Um dos temas que você precisa saber para o processo penal em 2015

Há coisas que simplesmente não sabemos que existem, mas existem. E o leitor pode conhecer a importância do controle de convencionalidade, tese apresentada por alguns colegas, dentre eles Valério Mazzuoli. Por isso na primeira coluna do ano partimos de uma sugestão de livro: O Devido Processo Penal: abordagem conforme a Constituição Federal e o Pacto de São José da Costa Rica, de Nereu José Giacomolli, editora Atlas. O autor é professor de Processo Penal (PUC-RS) e desembargador do TJ-RS, além de um grande cara.
Todos nós ouvimos falar em maior ou menor grau de devido processo legal e muitas vezes ficamos impressionados com a nossa ignorância em relação ao Sistema de Proteção dos Direitos Humanos existente no plano supranacional e que condenou o Brasil, e países vizinhos, diversas vezes. Daí que a leitura da obra mostra que diversos países foram obrigados a adequar o sistema processual penal às diretrizes de Direitos Humanos. E boa parte do senso comum teórico dos juristas não sabe disso.
Rui Cunha Martins, professor de Coimbra, no prefácio, bem resumiu as razões para se ler o trabalho de Nereu: “A primeira razão é a competência do autor. A segunda é a manifesta importância do tema na conjuntura atual. A terceira é a pertinente estratégia de estruturação da obra, aqui se incluindo o grau de inovação”.
E aqui na terceira razão sublinhada, cabe dizer que o livro apresenta a compreensão do Tribunal Penal Internacional e do Sistema Interamericano (CADH, CIDH), em pleno vigor no Brasil (Decreto Legislativo 27, de 28.05.1992 e Decreto Executivo 678, de 6 de novembro de 1992, bem assim Decreto Legislativo 89, de 3 de dezembro de 1998), proporcionando ao leitor os fundamentos dós órgãos internacionais. Aponta também os cuidados para admissibilidade da pretensão, notadamente o esgotamento das vias internas.
No que toca ao processo penal brasileiro, por exemplo, partindo da necessidade de humanização das práticas internas, narra a análise do comportamento do Estado brasileiro nos casos Damião Ximenes Lopes, Maria da Penha, Lund, Garibaldi, Escher e outros. E conhecer os fundamentos das condenações, especialmente o caso Maria da Penha, pode fazer ver a importância dos Direitos Humanos.
Exemplificativamente a corte já decidiu que: a) nos casos de interceptação telefônica o acusado precisa ter ciência de toda a conversação antes da eliminação da parte omitida pela acusação; que as regras restritivas da privacidade devem ser compreendidas pelo viés da proporcionalidade e que a polícia militar não pode requerer, dado que não é órgão com atribuição para tanto; b) a presunção de inocência, segundo Giacomolli, na linha adotada pelo Supremo Tribunal Federal, rejeita a prisão antecipadora da pena e desprovida de razões concretas (RHC 111.327), embora boa parte da magistratura utilize a prisão como mecanismo de controle social imediato ou mesmo para pressão psicológica (delata que te concedo benefícios); c) o acusado possui o direito de estar presente nos julgamentos e que alegações burocráticas não podem impedir o direito de estar presente e se confrontar com a prova que lhe pode causar a condenação; d) a defesa deve ter a última palavra nos julgamentos, sendo ilegal a manifestação do Ministério Público após a sustentação oral, salvo por questão de ordem. Se a acusação deseja sustentar deve fazer antes.
Assim é que o livro discorre sobre a compreensão da Comissão e da Corte Interamericana de Direitos Humanos sobre o estado de inocência; ampla defesa; contraditório; direito à prova; da não produção de prova contra si mesmo e direito ao silêncio; fundamentação das decisões; imparcialidade; juiz natural; acordos no processo penal; publicidade; sigilo; prazo razoável; prisão cautelar e direito ao recurso. Em todos os temas há indicação de julgamentos pertinentes à compreensão da CIDH.
A relevância e atualidade do livro são impressionantes. De um lado descreve o conteúdo e fundamentos das decisões da Corte Interamericana e, por outro, demonstra como o processo penal brasileiro está em desconformidade com a cláusula do devido processo legal. Aliás, conforme temos sustentado nos nossos escritos, cada vez mais se mostra importante entender que o Brasil assumiu compromissos externos de cumprimento dos Direitos Humanos. Aos que alegam que só defendemos “bandidos”, a criação dos juizados de violência doméstica foi impulsionada pela decisão da CIDH. A existência efetiva de um sistema de controle do poder exercido em face de cada um de nós é condição de possibilidade à implementação do devido processo legal substancial.
Esperamos sinceramente continuar repensando o processo penal brasileiro em 2015, quem sabe, a partir do devido processo legal substancial. Precisamos ampliar nossos horizontes democráticos, como diz Giacomolli: “O existir, mesmo na esfera superior da Constituição, a latere da convencionalidade, em determinados casos, mostra-se insuficiente. Todos os poderes e a cidadania se encontram sob a direção fundamental constitucional, mas nem sempre em uma completude democrática, embora represente, ao que aqui é objeto de enfrentamento, um significativo avançar no direcionamento do devido processo constitucional. Esse adelante encontra forte resistência em significativa parcela dos sujeitos processuais oficiais, na doutrina e na jurisprudência, pois forjados na cultura autoritária, burocratizada a manu militari, inquisitorial e na crença regeneradora da pena e do salvamento pelo processo penal”. Tenhamos sorte em 2015. Obrigado pela parceria e leitura da coluna Limite Penal.
Compartilhar
Aury Lopes Jr é doutor em Direito Processual Penal, professor Titular de Direito Processual Penal da PUC-RS e professor Titular no Programa de Pós-Graduação em Ciências Criminais, Mestrado e Doutorado da PUC-RS.
Alexandre Morais da Rosa é juiz em Santa Catarina, doutor em Direito pela UFPR e professor de Processo Penal na UFSC.
Revista Consultor Jurídico, 2 de janeiro de 2015, 10h11

Professora Tutora Lilian Barçalobre Manoel

segunda-feira, 25 de maio de 2015

Fiador responde por dívida de locação prorrogada se houver previsão em cláusula contratual

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que o fiador continua responsável pela dívida do locatário constituída após a prorrogação por prazo indeterminado do contrato de locação, desde que haja cláusula prevendo sua responsabilidade até a entrega das chaves.

O julgamento do recurso se deu em ação de débitos locatícios. O ministro Paulo de Tarso Sanseverino levou o processo de sua relatoria ao colegiado “com o intuito de reafirmar a jurisprudência da corte” e reformar o acórdão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC).

No caso julgado, o contrato de locação foi renovado automaticamente por prazo indeterminado, sem o consentimento expresso dos fiadores. O pacto continha cláusula que previa o prolongamento da fiança até a entrega das chaves.

Responsáveis solidários

A administradora imobiliária alegou no TJSC que os fiadores permaneceram como responsáveis solidários dos débitos não quitados, uma vez que a fiança se estenderia até a efetiva entrega das chaves.

No entanto, o TJSC entendeu que o contrato acessório de fiança deve ser interpretado “de forma mais favorável ao fiador”, de modo que a prorrogação do pacto locatício isenta os fiadores que com ela não consentiram, mesmo na hipótese de haver aquela cláusula.

No recurso especial, a administradora alegou dissídio jurisprudencial e violação do artigo 39 da Lei de Locações (Lei 8.245/91), que estabelece que as garantias da locação se estendem até a entrega das chaves, ainda que prorrogada a locação por prazo indeterminado, exceto quando houver dispositivo contratual que estabeleça o contrário.

Previsão contratual

Sanseverino declarou válida a cláusula do contrato de fiança que previa a continuidade da garantia para o período prolongado e deu provimento ao recurso da empresa.

Segundo o relator, como o pacto de locação se prorrogou por prazo indeterminado, não houve necessidade de aditamento contratual para a extensão da fiança, e bastou a expressa previsão do contrato nesse sentido. Nessas circunstâncias, destacou que não tem efeito a Súmula 214 do STJ, segundo a qual “o fiador na locação não responde por obrigações resultantes de aditamento ao qual não anuiu”.

Com a decisão, os fiadores remanescem como devedores solidários da obrigação não paga pelo locatário após a prorrogação da locação por prazo indeterminado, caso haja disposição contratual no sentido de que as garantias da locação se estendam até a entrega das chaves.


Professora Tutora Milena Franco Ribeiro

terça-feira, 19 de maio de 2015

DECLARAÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE SEM REDUÇÃO DE TEXTO E INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO: UMA ANÁLISE COMPARATIVA DAS TÉCNICAS DE DECISÃO

Por vezes, o Supremo Tribunal Federal pode afigurar necessária a adoção de uma declaração de inconstitucionalidade sem redução de texto, isto é, uma técnica de decisão que, sem proceder à alteração de seu texto normativo, somente considera inconstitucional uma determinada lei se aplicada a uma dada hipótese. Para Gilmar Ferreira Mendes (2008, p.1253), a declaração de inconstitucionalidade sem redução de texto deve ser utilizada para realçar que determinada aplicação do texto normativo é inconstitucional. Além disso, essa fórmula é dotada de maior clareza e segurança jurídica, o que vem expressa na parte dispositiva da decisão. Assim, por exemplo, a lei X é inconstitucional se aplicável a tal hipótese; a lei Y é inconstitucional se autorizativa da cobrança do tributo em determinado exercício financeiro[1]. Ora, a partir dessas premissas, infere-se, novamente com Gilmar Ferreira Mendes (2008, p.1253), que na declaração de inconstitucionalidade (nulidade) sem redução de texto, determinadas hipóteses de aplicação, constantes de programas normativos da lei, são inconstitucionais e, por isso, nulas.  
Não se mostra despiciendo registrar que o instituto em tela (declaração de inconstitucionalidade sem redução de texto), embora similar, não se confunde com um outro princípio hermenêutico denominado de interpretação conforme a Constituição. O próprio Supremo Tribunal Federal, embora já tenha equiparado ambas as figuras[2], parece caminhar rumo à diferenciação de cada uma das modalidades, como se pode observar na decisão proferida na medida liminar da ADI 491. A ação envolvia a discussão sobre a constitucionalidade do art. 86, parágrafo único, da Constituição do Estado do Amazonas, assim estatuído:

Art. 86. Lei Orgânica, de iniciativa facultativa do Procurador-Geral de Justiça, disporá sobre a organização e o funcionamento do Ministério Público, observando em relação aos seus membros:
Parágrafo único: Aplicam-se, no que couber, aos membros do Ministério Público os princípios estabelecidos no art. 64, I, II e IV a XIII, desta Constituição.

Já o artigo 64 da Constituição estadual, assim referida na disposição legal impugnada, consigna:

Art. 64. A Magistratura Estadual terá o seu regime jurídico estabelecido no Estatuto da Magistratura instituído por lei complementar de iniciativa do Tribunal de Justiça, observados os seguintes princípios:
V – os vencimentos dos magistrados serão fixados com diferença não superior a dez por cento de uma para outra das categorias da carreira, não podendo, a título nenhum, exceder os dos Ministros do Supremo Tribunal Federal. 

O Supremo Tribunal Federal, ao reconhecer que a inconstitucionalidade arguida quanto ao parágrafo único do artigo 86 da Constituição do Estado do Amazonas visava apenas à extensão, que ele determina, implicitamente, que se faça ao Ministério Público, do inciso V do artigo 64, já que essa extensão decorre dos termos “IV a XIII” que integram a remissão feita pelo primeiro dispositivo, utilizou a técnica da declaração de inconstitucionalidade sem redução de texto para suspender a aplicação do parágrafo único do art. 86 da Constituição estadual no que se refere à remissão ao inciso V do artigo 64 dela constante. Ora, como a remissão ao inciso V era inconstitucional, não havia, logicamente, possibilidade de “riscar” a referência a esse inciso, já que o modo como a norma em comento fora redigida não dava espaço para esse tipo de procedimento (MENDES, 2008, p.1254; TAVARES, 2012, p.293).
De fato, não há como confundir as duas modalidades que se põem sob análise. A fórmula hermenêutica da interpretação conforme[3], de matriz germânica, pretende revigorar a presunção relativa de constitucionalidade das leis e atos normativos expedidos pelo poder público. De modo que, de tantas interpretações possíveis do ato impugnado em face da inexorável plurivocidade sígnica da norma, deve-se admitir aquela que permite adequá-lo à Constituição, ou seja, deve-se adotar aquela que se revele compatível com a Constituição (CUNHA JÚNIOR, 2009, p.370; MENDES, 2008, p.1251). Estamos, portanto, com Lenio Luiz Streck (2004, p.612), quem, analisando o caso Português, onde as duas categorias são bem definidas, aduz que a interpretação conforme ocorre quando uma norma anteriormente reputada inconstitucional é considerada constitucional pelo Tribunal Constitucional, contanto que ela seja interpretada num sentido conforme a Constituição (interpretação adequadora). Já na inconstitucionalidade parcial sem redução de texto, declara-se inconstitucional um certo segmento ou secção da norma questionada. Enfim, “enquanto na nulidade parcial [...] declaram-se determinados ‘casos de aplicação’ como incompatíveis, na interpretação conforme à Constituição declaram-se determinadas ‘possibilidades de interpretação’ como compatíveis” (HECK, 1994, p.131). Também nesse sentido Mendes afirma que:

[...] enquanto na interpretação conforme à Constituição se tem, dogmaticamente, a declaração de que uma lei é constitucional com a interpretação que lhe é conferida pelo órgão judicial, constata-se, na declaração de nulidade sem redução de texto, a expressa exclusão, por inconstitucionalidade, de determinadas hipóteses de aplicação do programa normativo sem que se produza alteração expressa do texto legal. (MENDES, 2008, p.1.251)

Nesse passo, Rui Medeiros destaca, em síntese perfeita, que:

[...] enquanto na inconstitucionalidade parcial sem redução de texto (qualitativa) as diferentes normas que se extraem da disposição podem operar contemporaneamente, pois regulam fattispecie diversas ou determinam efeitos independentes, já na interpretação conforme a Constituição as diferentes normas que resultam das interpretações contrastantes estão destinadas a operar alternativamente. (apud STRECK, 2004, p.612-613)

Ademais, não se pode perder de vista que a própria redação do parágrafo único do artigo 28 da Lei n. 9.868/99 corrobora o tratamento distinto que se deve dar às duas figuras, quando dispõe que “a declaração de constitucionalidade ou de inconstitucionalidade, inclusive a interpretação conforme a Constituição e a declaração parcial de inconstitucionalidade sem redução de texto, têm eficácia contra todos e efeito vinculante em relação aos órgãos do Poder Judiciário e à Administração Pública federal, estadual e municipal”[4].

Professor Tutor Mateus Pieroni Santini

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
CUNHA JÚNIOR, Dirley da. Curso de direito constitucional. 3.ed. Salvador: Juspodivm, 2009.
HECK, Luís Afonso. O Recurso Constitucional na Sistemática Jurisdicional Constitucional alemã. Revista de Informação Legislativa. Brasília, Senado Federal, ano 31, n. 124, out./dez. 1994.
MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2008.
STRECK, Lenio Luiz. Jurisdição constitucional e hermenêutica: uma nova crítica do direito. 2.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004. 
TAVARES, André Ramos. Curso de direito constitucional. 10.ed. São Paulo: Saraiva, 2012.



[1] A propósito, essa orientação ficou sumulada no enunciado 67 do STF, segundo o qual”é inconstitucional a cobrança de tributo que houver sido criado ou enumerado no mesmo exercício financeiro”.
[2] No julgamento da ADI 1371-8/DF, de relatoria do Min. Néri da Silveira, o Supremo Tribunal Federal, perfilhando a tese da unidade conceitual de ambos os institutos, “julgou parcialmente procedente a ação direta, para sem redução de texto, (a) dar, ao artigo 237, inciso V, da LOMIN (LC 75/93), interpretação conforme à Constituição, no sentido de que a filiação partidária de membros do Ministério Público da União somente pode efetivar-se nas hipóteses de afastamento de suas funções institucionais, mediante licença, nos termos da lei, e (b) dar, ao art. 80 da LC 75, interpretação conforme à Constituição, para fixar como única exegese constitucionalmente possível aquela que apenas admite a filiação partidária, se o membro do Ministério Público estiver afastado de suas funções institucionais, devendo cancelar sua filiação partidária antes de reassumir suas funções, quaisquer que sejam, não podendo, ainda, desempenhar funções pertinentes ao Ministério Público Eleitoral senão após o cancelamento dessa mesma filiação político-partidária”.
[3] O Supremo Tribunal Federal faz importante reflexão acerca dos limites da “interpretação conforme à Constituição”. Fazendo remissão aos julgados da Corte, Gilmar Ferreira Mendes (2008, p.1.255) afirma que esses limites emergem tanto da expressão literal da lei quanto da chamada vontade do legislador. A interpretação conforme à Constituição só poderia ser admitida se não consubstanciar prática que viole a expressão literal do texto e não alterar o significado do texto normativo, com mudança radical da própria concepção original do legislador. 
[4] “Alguns autores entendem que não há diferenças sensíveis entre a interpretação conforme a Constituição e a inconstitucionalidade parcial sem redução de texto. Wassilios Skouris, por exemplo, comunga dessa tese, dizendo que a similitude exsurge quando se observa que a interpretação conforme, na acepção usualmente utilizada, envolve, no seu lado negativo, a rejeição de uma decisão (inconstitucional) da lei, não sendo possível nem necessária uma distinção razoável entre os dois tipos de decisão.” (STRECK, 2004, p.612)

terça-feira, 12 de maio de 2015

A cobrança do Imposto de Renda sobre o adicional de férias gozadas



Em recente julgamento de recurso repetitivo, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que incide Imposto de Renda (IR) sobre o adicional de férias gozadas correspondente a um terço do salário do trabalhador (REsp nº 1459779).

O entendimento é no sentido de que o terço de férias gozadas tem caráter remuneratório e, assim, deverá incidir o IR.

Com efeito, as contribuições previdenciárias devem incidir sobre todas as verbas recebidas pelo empregado que possuam natureza salarial.

Contudo, não há que se falar em incidência de tal exação sobre verbas de natureza diversa, aí se inserindo as verbas indenizatórias, assistenciais e previdenciárias. Este é o posicionamento de parte da doutrina e da jurisprudência.

Para definir se uma verba possui ou não natureza jurídica salarial não importa o nome jurídico que se lhe atribua ou a definição jurídica dada pelos particulares ou contribuintes e mesmo pelo próprio legislador. É fundamental que se avalie as suas características. E mais, o direito ao adicional tem o objetivo de reparar o desgaste sofrido pelo trabalhador em decorrência do exercício normal de sua profissão durante o período aquisitivo.

Como sabemos, o adicional (terço) de férias está previsto no artigo 7º, XVII, da Constituição Federal que estabelece: "São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social: gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal;".

Trata-se de um acréscimo pago quando do gozo de férias, o qual, além de não remunerar qualquer serviço ou tempo a disposição do empregado, não se incorpora aos salários dos trabalhadores para fins de aposentadoria.

Assim, a discussão que se impõe é se tal parcela possui ou não natureza salarial e, consequentemente, em caso negativo, se isso implicaria no afastamento ou violação dos artigos 22, I, da Lei 8.212/91; artigos 148 e 449, da CLT, e artigos 150, I, 195, I e 201, § 11, todos da Constituição Federal.


No Supremo Tribunal Federal  o tema ainda é objeto de análise por meio de recurso em repercussão geral, mas já existe uma posição defendida na Corte no sentido de que o adicional possui natureza indenizatória.

Professor Tutora Liliane Ayala

quinta-feira, 7 de maio de 2015

Progressão de regime e reparação do dano em crime contra a administração pública

É constitucional o§ 4º do art. 33 do CP, que condiciona a progressão de regime de cumprimento dapena de condenado por crime contra a administração pública à reparação do dano que causou, ou à devolução do produto do ilícito praticado, o parcelamento da dívida.
Com base nessa orientação, o Plenário, por maioria,negou provimento a agravo regimental interposto em face de decisão que indeferira pedido de progressão de regime a condenadonos autos da AP 470/MG (DJe de 22.4.2013) pela prática dos crimes de peculato e corrupção passiva.
O Colegiado, inicialmente,rejeitou assertivasegundo a qual seria ilíquido o valor devido pelo sentenciado a título de reparação do dano causado em decorrência do crime de peculato, dado que, em sucessivos pronunciamentos do Plenário, teria sido demonstrado que o valor devido, para fins do art. 33, § 4º, do CP, seria de R$ 536.440,55.
Quanto à alegada inconstitucionalidade do referido dispositivo legal, a Corte destacou que, em matéria de crimes contra a administração pública —como também nos crimes de colarinho branco em geral —, a parte verdadeiramente severa da pena, a ser executada com rigor, haveria de ser a de natureza pecuniária.
Esta, sim, teria o poder de funcionar como real fator de prevenção, capaz de inibir a prática de crimes que envolvessem apropriação de recursos públicos. Por outro lado, a imposição da devolução do produto do crime não constituiria sanção adicional, mas, apenas a devolução daquilo que fora indevidamente apropriado ou desviado.
Ademais, não seria o direito fundamental à liberdade do condenado que estaria em questão, mas, tão somente,se a pena privativa de liberdade a ser cumprida deveria se dar em regime mais favorável ou não, o que afastaria a alegação quanto à suposta ocorrência, no caso, de prisão por dívida.
Outrossim, a norma em comentonão seria a única, prevista na legislação penal, a ter na reparação do dano uma importante medida de política criminal. Ao contrário, bastaria uma rápida leitura dos principais diplomas penais brasileiros para constatar que a falta de reparação do dano: a) pode ser causa de revogação obrigatória do “sursis”; b) impede a extinção da punibilidade ou mesmo a redução da pena, em determinadas hipóteses; c) pode acarretar o indeferimento do livramento condicional e do indulto; d) afasta a atenuante genérica do art. 65, III, b, do CP, entre outros. (Informativo 772, Plenário)

Professora Tutora Juline Chimenez Zaneti