segunda-feira, 13 de outubro de 2014



Atividade agrícola e Atividade Rural

Com a finalidade de auxiliar e instrumentalizar o estudioso nos estudos das atividades urbanas e rurais, bem como sobre os tipos de aproveitamento do solo, esse breve texto tem como objetivo distinguir atividade agrária de atividade rural, bem como delimitar suas principais características.

A terminologia agrário e rural, para muitos autores, se confunde (PROENÇA, 1999, p. 18). No entanto, a doutrina mais moderna vem defendendo que atividade rural não equivale à atividade agrária.

A atividade agrária não necessariamente está relacionada à exploração do solo em suas potencialidades naturais, logo, não se confunde atividade agrária com atividade rural.

Nas palavras de Gustavo Rezek, estudioso já consagrado no Direito Agrário, a atividade agrária é:


“atividade humana de cultivo de vegetais e de criação de animais, caracterizada pela presença de um processo orgânico de desenvolvimento desses vegetais e animais, sujeito às leis naturais – e, portanto, não totalmente controlado pelo homem – cujos produtos, sendo coisas, são destinados ao consumo social em sentido amplo, ou seja, não somente ao consumo alimentar”(...) “Será agrária, em nosso entender, a criação de cavalos [...] e a criação de ratos cobaia”. (REZEK, p. 29-30).

Note-se que atividades agrárias podem ocorrer em áreas urbanizadas. Criação de pequenos animais para fins científicos, produção de vegetais hidropônicos, apiário e outras atividades agrárias podem ser desenvolvidas em área urbana. Trata-se de atividades agrárias que não dependem de exploração rústica do solo, podendo ocorrer, portanto, em áreas urbanas.

Ele prossegue ademais que algumas atividades que implicam no aproveitamento rústico do solo, não são agrárias: “O extrativismo vegetal e animal – a caça, a pesca a coleta de frutas – não pode ser considerado em sentido ato agrário. Muito mais flagrante á a exclusão de atividade de mineração, na qual inexiste sequer o ciclo agrobiológico” (REZEK, p.31e 32).

Embora seja importante ressalvar discussões doutrinárias a respeito do tema, o conceito de atividade agrária de Gustavo Rezek tem sido amplamente aceito para os estudos de Direito Agrário.

Diferentemente, outra finalidade e portanto outro conceito recebe a expressão atividade rural. Ela está relacionada à exploração rústica do solo, ao uso e fruição das potencialidades naturais (MENDONÇA LIMA. 1997, p. 173 e CERRILLO, F. & MENDIETA, p17). A doutrina traça a definição de atividade rural com fundamento especialmente nos incisos I, artigo 4º, do Estatuto da Terra e da Lei 9.629/93.

Fernando Sodero ensina: “a expressão ‘atividade rural’ compreende, além da posse e uso da terra, a sua exploração em qualquer das várias modalidades, quer agrícola, quer pecuária, agroindustrial ou extrativa” (SODERO, p. 33). Favorino Mércio, por sua vez, definiu no artigo 4º do seu projeto de Código Rural que “a vida rural compreende a cultura dos campos em todas as suas manifestações, a saber: a pecuária, a agricultura, e todas as indústrias rurais” (MENDONÇA LIMA, p.17). Veja que há atividades rurais que extrapolam a noção de atividade agrária.

José Afonso da Silva, numa perspectiva finalística, assinala que os terrenos em seu estado natural, são voltados à produção das chamadas riquezas naturais (SILVA, p. 83), sendo que essas atividades seriam rurais.

Dorgival Terceiro Neto acresce que a atividade rural é aquela que busca a exploração rústica com um fim primordialmente econômico, assinalando que o simples plantio amador, o gosto pela terra, a satisfação de plantar, como ocorre comumente em sítios, não configuram a própria atividade rural (TERCEIRO NETO, p.18).

As demais atividades que servem ou potencializam a própria exploração rústica do solo, como construção de moradia para os trabalhadores, construção de terreiros, galpões, coxos, etc (PINTO, p.299 ), embora não sejam propriamente exploração do solo, são atividades rurais visto que inexistiriam se não fosse para tal fim. Vicente Chermont de Miranda é claro nesse sentido:

a função do agricultor não se exaure na exclusiva produção do fruto direto, mas se integra com todas aquelas formas de atividades que têm a sua base no fundo rural e que constituem o objeto e o conteúdo da indústria agrária. E isso, tanto do ponto de vista das leis especiais que têm procurado regular o assunto, como do aspecto econômico. No exercício de sua atividade, o agricultor não pode se limitar apenas à exploração agrícola, à produção de frutos diretos, de vez que tem de realizar uma série de outras operações no intuito de aperfeiçoar a sua produção a fim de torná-la mais lucrativa. Desta forma, o aproveitamento do fundo agrícola, em sua maior amplitude, obriga o agricultor à prática da natureza agrícola, mas se destinam na realidade, a tornar possível aquele desfrute pleno do fundo agrário (MIRANDA, p. 89).

Essencialmente, o aproveitamento rústico do solo é que configura a atividade rural (ESCRIBANO COLLADO. P 183).

Pode-se verificar que atividade rural refere-se à exploração rústica do solo com finalidade econômica. Como exemplo de atividade rural, pode-se citar o cultivo, a criação de gado, o extrativismo mineral, o extrativismo animal, o extrativismo vegetal e as atividades exercidas no solo que auxiliam, potencializam ou viabilizam sua exploração.

Note-se, por fim, que: a) nem toda atividade agrária se dá em solo rural. Ela pode ocorrer em solo urbano; b) nem todo atividade rural é agrária. Há atividades rurais que não se enquadram no conceito de atividade agrária; c) as atividades rurais estão relacionadas à exploração rústica do solo. Surge a pergunta se é possível realizar exploração rústica do solo em áreas urbanas. A resposta não é simples e exigiria outros estudos.

Bibliografia


CERRILLO, F. & MENDIETA, L. Derecho agrário. Barcelona: Bosch, 1952.

COLLADO, Escribano. La propriedad privada urbana. Madrid: Montecorvo, 1979.

MENDONÇA LIMA. Rafael Augusto de. Direito agrário. Rio de Janeiro: Renovar, 1997.

MIRANDA, Vicente Chermont de. Agriculura. Repertório enciclopédico do direito brasileiro. SANTOS, J. M. Carvalho (org.) Rio de Janeiro: Editora Borsoi, Volume 3.

PINTO, Victor Carvalho. Direito urbanístico. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.

REZEK, Gustavo Elias Kallás. Imóvel agrário. Curitiba: Juruá, 2007

SILVA, José Afonso. Direito urbanístico brasileiro. 4ª Ed. São Paulo: Malheiros, 2006.

SODERO. Fernando Pereira, Curso de direito agrário – O Estatuto da Terra. Brasília: Fundação Petrônio Portela, 1982.

TERCEIRO NETO, Dorgival. Noções preliminares de direito agrário. 2ª ed. João Pessoa: Editora Universitária UFPB, 1985.


Professor tutor Ronaldo Gerd Seifert